O Jovem Rico



Fonte: https://www.lds.org/bible-videos/videos/christ-and-the-rich-young-ruler?lang=por



Lendo a parábola do Jovem Rico, me deparei com duas versões do texto. O que me chamou atenção é o fato de que, apesar de distintas, complementam-se. Ao lê-las em conjunto, temos uma interpretação mais completa do evento do que ao lê-las de forma isolada. Vamos aos textos:

Texto 01

Eis que alguém se aproximou de Jesus e lhe perguntou: "Mestre, que farei de bom para ter a vida eterna? "
Respondeu-lhe Jesus: "Por que você me pergunta sobre o que é bom? Há somente um que é bom. Se você quer entrar na vida, obedeça aos mandamentos".
"Quais? ", perguntou ele. Jesus respondeu: " ‘Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não darás falso testemunho,
honra teu pai e tua mãe’ e ‘amarás o teu próximo como a ti mesmo’".
Disse-lhe o jovem: "A tudo isso tenho obedecido. O que me falta ainda? "
Jesus respondeu: "Se você quer ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me".
Ouvindo isso, o jovem afastou-se triste, porque tinha muitas riquezas.
(Mateus 19:16-22)

Texto 02

E, pondo-se a caminho, correu para ele um homem, o qual se ajoelhou diante dele, e lhe perguntou: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna?
E Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom senão um, que é Deus.
Tu sabes os mandamentos: Não adulterarás; não matarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; não defraudarás alguém; honra a teu pai e a tua mãe.
Ele, porém, respondendo, lhe disse: Mestre, tudo isso guardei desde a minha mocidade.
E Jesus, olhando para ele, o amou e lhe disse: Falta-te uma coisa: vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, toma a cruz, e segue-me.
Mas ele, pesaroso desta palavra, retirou-se triste; porque possuía muitas propriedades.
(Marcos 10:17-22)

A diferença principal entre os dois textos está nos primeiros versículos. No primeiro, o jovem rico questiona: "Mestre, que farei de bom para ter a vida eterna? ". Já no segundo, diz: “Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna?”. Pode parecer a mesma coisa, mas não é. E a chave interpretativa é o termo “bom”. Veja que em um dos textos Jesus é questionado sobre o que devo fazer de bom. Já, no outro, Jesus é chamado de bom.
Nos dois casos, o jovem é corrigido: “Por que você me pergunta sobre o que é bom? Há somente um que é bom”, no primeiro. E “Por que me chamas bom? Ninguém há bom senão um, que é Deus”, no segundo.
A bondade deve ser entendido aqui como um atributo exclusivo de Deus: Ninguém há bom senão um, que é Deus. Assim, quando o jovem expressa seu desejo de ser bom, de certa forma, expressa também um desejo ser como Deus. E este sentido é completado no final da história: quando confrontado, o jovem opta pela riqueza, que estaria sob seu controle, do que caminhar junto a Jesus, submetendo-se.
Interessante notar que o jovem procurou Jesus e, de acordo com o texto de Marcos, chama Jesus de bom, aceitando-o como filho de Deus: “Por que me chamas bom? Ninguém há bom senão um, que é Deus”. Era um homem religioso, que ficou triste por não conseguir abandonar suas riquezas, para seguir a Cristo. O que os evangelistas indicam nesta história é, em primeiro lugar, que Jesus conhece o que está em nosso coração e, em segundo, quão difícil é abandonar os nossos desejos, o que está em nosso controle, para segui-Lo.
É o que Jesus está dizendo ao Jovem Rico, quando o questiona: "Por que você me pergunta sobre o que é bom? Há somente um que é bom”. Cristo estava dizendo ao jovem que, por suas forças, não alcançaria a bondade, já que a mesma só poderia ser alcançada por intermédio de Jesus. Daí indicar o que seria possível, naquele momento, especialmente para um homem religioso: seguir os mandamentos.
Mas o jovem insiste com Jesus, talvez por saber que não estava completo, que faltava algo. Mas o que faltava? Entregar sua vida para Jesus. Quantas pessoas tem tudo: família, sucesso, carreira, dinheiro, mas vive vazia, como se algo faltasse em suas vidas. E Jesus diz: "Se você quer ser perfeito …”.
Jesus sabe da impossibilidade de alcançarmos a perfeição. Justamente por sermos imperfeitos é que Jesus veio ao nosso socorro. A única forma de alcançarmos a salvação é por meio e mérito de Jesus, e não pelo mérito dos homens. Jesus sabia o que estava no coração do jovem, o que lhe impedia de segui-Lo. Sabia que era demais para o jovem abandonar sua riqueza: "Se você quer ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me". Completa-se aqui a ideia inicial, de que apenas um é bom, e que alcançar a bondade, a perfeição ou a salvação, está além das nossas forças.
Deus é bom, e é também amor. Em Marcos, o evangelista diz: “E Jesus, olhando para ele, o amou”. Jesus o amou apesar de seus pecados. Apesar de conhecer o que estava em seu coração. Jesus nos ama apesar de quem somos. Mas o jovem foi incapaz de amá-Lo. Amou o dinheiro, que o separou de Cristo.
O que está em nosso coração, que nos impede de seguir a Cristo? Assim como o jovem, muitos chegam até Ele, mas é incapaz de abandonar sua antiga vida, suas práticas. Jesus disse para o jovem: “vá e venda seus bens”. Mas poderia dizer: vá e abandone a mentira e a corrupção. Ou: vá, abandone o adultério e restaure sua família. Ou seja, não há oposição a riqueza propriamente dita, mas ao elemento que, neste caso, separa homens de Deus. Por isso afirmar, na sequência, de que seria “mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos céus” (Mateus 19:24).
Jesus sabe o que está em nosso coração, e sabe de nossos limites. Por isso, em um primeiro momento, indica o que é possível, sabendo da impossibilidade do jovem de ser bom. Porém, em um segundo momento, coloca uma condição que seria impossível para aquele homem, mas respaldada na lembrança de que nada é impossível para Jesus. Bastava o jovem rico aceitar sua condição humana, de que não poderia seguir por suas forças, de que o amor deveria ser dedicado a Cristo e não ao dinheiro, e abandonar a idolatria pela riqueza e o que ela gera.

(Isso me lembra de uma música do Raul Seixas, chamada “Ouro de Tolo:



Quando Raul Seixas relata a tristeza de um homem que tem tudo, mas se vê em uma situação de apatia, de vazio interior. Talvez, para este homem, falte uma coisa: Jesus).

O que é nossa riqueza? O que nos impede de caminharmos com Jesus? O que nos faz acreditar que somos suficientes em nós mesmos, que é possível a bondade e a perfeição sem Cristo? A riqueza, o trabalho, a família, o sexo?
Logo após este episódio, os discípulos perguntam: quem pode ser salvo? E Jesus é enfático em sua resposta, explicando o diálogo com o Jovem Rico: para o homem é impossível a salvação, enquanto que para Deus, tudo é possível. É isto que está sendo dito: você não tem condição de ser bom, pois apenas um o é, Jesus. Você não pode alcançar a bondade, a perfeição ou a salvação por sua vontade ou por seus méritos. Só um é bom, só um é perfeito, e só um pode nos garantir a salvação: Jesus Cristo.

Comentários