Cadeião de Londrina: Pequeno Histórico

“CADEIÃO” DE LONDRINA: PEQUENO HISTÓRICO

Fonte: https://www.sescpr.com.br/unidades/sesc-londrina-cadeiao/


“Cadeias” na Terra da Promissão


Já na década de 1930 Londrina atrai forasteiros de diversas partes do Brasil e do mundo. O intenso fluxo de pessoas e o desenvolvimento urbano teve como consequência a necessidade de cuidado com a ordem e os bons costumes, especialmente por se tratar de um empreendimento privado, em fase de consolidação. É neste sentido que a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) indica ao então presidente da Província do Paraná, Caetano Munhoz da Rocha, o nome de João Wanderlei, que seria mais tarde o primeiro presidente do legislativo londrinense, para ocupar o posto de Inspetor de Quarteirão. Também vinculado a CTNP, assumiria o cargo de sub-delegado de Londrina Carlos de Almeida, ocupando-o entre os anos de 1931 e 1938. Manter a ordem fazia parte do negócio …
A cidade projetada para não ter mais de 30 mil habitantes crescia a um ritmo acelerado. O café, também conhecido como o Ouro Verde, atraía ainda mais pessoas para a cidade, gente que chegava à cidade sonhando com a riqueza que brotava nos cafezais.
A ordem pública seria, de certa forma, abalada com o progresso: posseiros, jogatinas e prostituição tornaram-se alvo daqueles que defendiam a manutenção dos bons costumes e a tranquilidade de uma cidade do interior. Visando atender esta necessidade e colocar “a casa em ordem”, Aquiles Ferreira Pimpão assume a delegacia de Londrina, em 1938, transferindo a cadeia pública da Rua Mato Grosso esquina com Rua Maranhão para a Rua Sergipe.
A segunda cadeia de Londrina era feita em madeira e possuía uma construção frágil, que possibilitava fugas, levando a construção da terceira cadeia da cidade (Cadeião), no lugar onde antes estava a delegacia de madeira, provavelmente no ano de 1943, seguido de uma reforma efetuada em 1953 e uma ampliação em 1963.


O Cadeião de Londrina e suas Marcas


Com o decorrer dos anos, o Cadeião passou a parecer um “queijo suíço” devido a grande quantidade de túneis e buracos cavados por detentos no piso, nas paredes e no teto. Os números das fugas por si só, são mais do que suficientes para demonstrar a precariedade da cadeia na cidade. O prédio foi construído para abrigar cerca de 50 detentos e, na época de sua desativação, abrigava quase 200, muitos deles de alta periculosidade que deveriam estar cumprindo pena no Presídio Central do Estado ou na Colônia Penal Agrícola.  Era possível ainda conversar com os presos, já que as janelas de algumas celas estavam voltadas para a Rua Brasil.
No seu tempo de funcionamento, o Cadeião recebeu diversos adjetivos, como “panorama do inferno” e “pior cadeia do Paraná”. Em 1993 foi desativado, sendo os presos transferidos para a Penitenciária Estadual de Londrina e o local serviu como depósito de objetos apreendidos pela polícia.
O município realizou permuta do local com o Estado na administração do prefeito Luis Eduardo Cheida. O prédio da cadeia ficou com o município que, por sua vez, cedeu o terreno da penitenciária de Londrina e uma gleba de terras na Avenida 10 de Dezembro com o compromisso do Estado de construir lá a sede da 10ª Sub-delegacia Policial (SDP), Instituto de Criminalística e Instituto Médico Legal (IML), o que não ocorreu até o presente momento. Entretanto, em 1994, o governador Roberto Requião e o Secretário de Segurança José Tavares decidiram derrubar o Cadeião, pretendendo construir ali o IML e o Instituto de Criminalística. Segundo Tavares, não era coerente “deixar de pé” um marco que somente trouxe tristeza à cidade. A Secretaria Estadual de Justiça queria a demolição, marcada para o dia 28 de março de 1994, mas foi impedida por um grupo constituído principalmente por professores e estudantes do curso de Arquitetura da Universidade Estadual de Londrina (UEL).


Um Prédio sem Função?


As primeiras investidas contra o prédio da antiga cadeia pública foram assistidas por uma platéia com opiniões divididas. Foi preciso um cordão de isolamento da polícia militar para que os operários começassem o trabalho. O então Chefe do Departamento de Arquitetura da UEL, Marcos Barnabé, que chegou a se posicionar a frente da pá carregadeira para evitar a derrubada do muro, defendeu a participação da população para opinar sobre o destino do prédio. Como parte do grupo que defendia a demolição do prédio estavam parentes de presos que cumpriram pena na velha cadeia da cidade. Antonia Maria de Paiva acompanhou a demolição: “Meu filho ficou preso nesta cadeia e está com o corpo queimado por causa de um princípio de incêndio em um dos cubículos. Sou a favor da destruição do prédio”. Dalvina Rezende contou que seu irmão ficou detido por quase dois anos nesta cadeia e ficou internado em um manicômio. “Ele foi maltratado e espancado. Este prédio só causa más recordações. Tem que ser derrubado”. Porém, antes da transferência, o Cadeião ficou aberto para visitação, para que a população o conhecesse.
Depois do período polêmico envolvendo a demolição do edifício, alguns projetos de revitalização foram propostos. As mudanças sociais, econômicas e espaciais muitas vezes demandam que alguns locais mudem sua função para atender às novas necessidades que surgem, pois se tornam obsoletos.
Em 1993, quando o governador Roberto Requião esteve em Londrina para inaugurar a Escola Oficina no Conjunto João Paz (Zona Norte), anunciou um projeto para construção de uma praça no lugar do Cadeião. Segundo o mesmo, “Será um lugar para o lazer, ao lado de onde funciona atualmente esta infame delegacia de Londrina”. Em 1994, segundo registros houve a iniciativa de um projeto de transformar o Cadeião em um shopping de artesanato. No lugar das celas seriam construídas pequenas salas comerciais para venda de artesanato, obras artísticas, discos, roupas, banca de revistas e prestação de serviços.
Em 05 de abril de 1995 a Folha de Londrina publicou uma pesquisa sobre qual seria o melhor destino para o Cadeião: das 600 pessoas entrevistadas, 73% preferiam a demolição (destes, 31% optaram pela construção de um Instituto de Criminalística, 27% uma escola para policiais civis, 25% uma praça e 17% um mini-shopping). Mesmo as pessoas que optaram pela não demolição do prédio, a maioria aceitava a ideia de reforma, mesmo que resultasse em alteração de suas características originais. Somente 5% desejavam a manutenção sem alteração.
Em 1996, um projeto de um grupo de artistas independente chamado “Efêmeros e Perpétuos” previa um movimento envolvendo todas as áreas culturais aproveitando o material existente no cadeião, como pinturas, colagens, grafitagens nas paredes e até antigos varais onde os presos penduravam suas roupas, desde que não alterassem as instalações do antigo Cadeião.
Em 2001, o então governador Jaime Lerner em visita à cidade trouxe uma nova promessa para revitalizar o espaço. O projeto previa a construção de um auditório de música, o que não foi realizado. O espaço foi utilizado ainda para ser cenário da peça “Apocalipse 1.11”, do Grupo Vertigem, de São Paulo, encenada no FILO – Festival Internacional de Teatro de Londrina, em 2002, e de um documentário de seis minutos sobre sua história, denominado “Nem todos que estão são, nem todos que são estão”,  produzido em pelo projeto Oficinas Kinoarte, sob a coordenação do cineasta Kiko Goifman. Em 2010 foi cenário de mais uma produção da Kinoarte, intitulado “Galeria”, documentário dirigido por Evelyssa Sanches, que obteve o Prêmio de Melhor Montagem no 1º Festival de Cinema de Petrópolis (RJ) e Melhor Documentário da Mostra Alternativa do 9º Festival de Guaíba (RS).  Ainda em 2010, no dia do aniversário de Londrina (dez de dezembro), foi oficializada a cessão em comodato do antigo Cadeião para a FECOMÉRCIO – Federação do Comércio do Paraná, que tem a responsabilidade de restaurar a antiga edificação juntamente com a proposição de um novo espaço anexo,  e a partir disso  dar nova função ao local: a criação de um SESC-Cultura.
Hoje o Sesc cadeião está em funcionamento: https://www.sescpr.com.br/unidades/sesc-londrina-cadeiao/

Texto integrante do livro "Rua Sergipe: Patrimônio Cultural Londrinense", disponível no link: http://educacaopatrimonial.com.br/#publicacoes/08.html


REFERÊNCIAS


AS CADEIAS de Londrina. Folha Norte, Londrina, Nossa História, 17 a 23 nov 2007, p. 4.
FILHO, Marinósio. Dos porões da delegacia de polícia. Londrina: Canadá, 1979.
LIVORATTI, Pedro. Protesto não pára demolição da cadeia. Folha de Londrina, Londrina, Caderno Londrina, 29 mar 1994, s/n.
MENEGHEL, Stella. Município renova promessa de revitalizar antigo cadeião, Jornal de Londrina, Londrina, Caderno Cidade, 15 jul 2009, p. 5.
NOGUEIRA, Áureo. Cadeia de Londrina não segura ninguém. Folha de Londrina, Londrina, Caderno Reportagem, 21 jun 1992, p. 16.
PESQUISA tardia revela: cadeia deve cair. Folha de Londrina, Londrina, Opinião Popular, 05 abr 1994, p. 02.
PISSININI, Suzi. Artistas querem usar prédio do cadeião. Jornal de Londrina, Londrina, Caderno Cidade, 10 ago 1996, s/n.
SANTIN, Wilhan. Cadeião: o “inferno” abandonado no centro. Folha de Londrina, Caderno Cidade, 05 set 2008, p. 03.
UMA praça no lugar da velha cadeia. Folha de Londrina, Londrina, Caderno Paraná, 29 abril 1993, p. 5.

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